Friday, April 1, 2011

Diário da Madeira 14


Não andaram muito longe das regras básicas do jornalismo: o quê, quem, quando, como e porquê. Sem que disso tivessem consciência, os alunos da Escola Secundária do Machico foram autênticos jornalistas diante uma mesa cheia de escritores: Afonso Cruz, José Mário Silva, Patrícia Portela, Paulo Sérgio BEJu e Valter Hugo Mãe. Dia de festa na escola, já que por lá nunca se viu tantos autores juntos. E ninguém perdeu a oportunidade. Sala cheia, atenção redobrada, perguntas, respostas. E muitas surpresas. Ficámos a saber, por exemplo, que o novo livro de Valter Hugo Mãe, que sairá na Objectiva em Setembro, terá muito de lobos. Foi o que revelou a um aluno quando este lhe perguntou em que condições preferia escrever. "Isolado", disse o autor de A máquina de fazer espanhóis, sobretudo a partir do momento em que os amigos passaram a tocar à porta da sua casa hora sim, hora não. Tudo boas intenções - "Precisas de alguma coisa?" - mas com péssimos resultados para quem, com a idade, se tornou rezingão e defende cada vez mais o seu espaço. Solução: fugir de Vila do Conde, onde vive, e procurar refúgio em casas de amigos.
Para este último romance, calhou-lhe uma no Lindoso, no Gerês. Aldeia deslumbrante, com paisagens de cortar a respiração, só que... a casa tinha janelas pequenas e todas davam para as ruínas do edifício da vizinha. "Resta-me apenas", pensou Valter Hugo Mãe, "contemplar a vista nos passeios a pé até ao café". Só que... "a aldeia está cheia de cães", avisou-lhe uma senhora. E à noite ainda era pior: "Quando pensa que lhe vai sair um cão, surge-lhe um lobo". Concluindo o alerta, acrescentou: "Não os chame, nem os tente afastar. Eles ferram".
Eis como um romance que era para ser alegre e positivo, tornou-se numa obra sombria. Porque, como se sabe, quando os lobos uivam, não há literatura nos que salve.

No comments:

Post a Comment