De um lado, o presente, do outro, o passado. De outrora, a paixão avassaladora entre Robert e Elizabeth Barrett Browning. De agora, o encontro entre dois investigadores, inesperadamente disponíveis para amar. Assim se tece a malha do primeiro romance de Maria João Martins , 43 anos, que é lançado hoje, às 18 e 30, na Fnac Chiado, e que não é alheio à sua profissão de jornalista, no Diário de Lisboa, no Sete e há mais de 20 anos no JL. Na sua escrita está impregnado o vício das perguntas e nesta história de dois tempos interessou-lhe perceber até onde estamos dispostos a viver um amor ou qual o limite da nossa entrega ao outro. À semelhança da novela Escola de Validos, que lançou em 2007, ou dos ensaios O Paraíso Triste e Divas, Santas e Demónios, Como o Ar Que Respiras (Porto Editora) é uma indagação da vida e da liberdade individual.
Jornal de Letras: Este romance é o resultado do seu interesse pela relação amorosa e literária entre Robert e Elizabeth Barrett Browning?
Foi essa paixão avassaladora que a conduziu na história de Angie e Gabriel?
Como jornalista, tenho o vício das perguntas. O que me conduziu na história de Angie e Gabriel, o casal deste romance que vive na atualidade, foi, antes de mais, a necessidade de perguntar a mim mesma e aos leitores se ainda seremos capazes de viver até ao limite um amor desta dimensão, em que a entrega ao outro é incondicional e irreversível.
Este parece também ser um romance sobre a liberdade pessoal. Concorda?
Sem dúvida. A Elizabeth B. Browning o amor de Robert trouxe também a libertação face a uma realidade familiar patologicamente opressiva, mesmo para o modelo de sociedade vitoriana. O que resta saber (e essa é outra das questões levantadas pelo romance) é se na nossa sociedade, tão livre na aparência, o amor pode desempenhar algum papel na libertação do indivíduo.
É possível encontrar paralelos entre a época vitoriana e a atualidade, os dois tempos do romance?
George Steiner tem um ensaio brilhante sobre as diferenças entre a nossa época e a dos vitorianos e John Fowles dedicou ao tema um romance brilhante: A Amante do Tenente Francês. Creio que nos opõe aos vitorianos uma outra forma de viver o tempo, muito mais acelerada, que condiciona o pensar e o sentir (e segundo Steiner nos torna muito mais dispersivos e incapazes de obras de grande dimensão). Mas também creio que, em matéria de amores, continuamos a ser os herdeiros do modelo romântico oitocentista, com os seus dramas de dimensão operática. Somos nostálgicos de um absoluto que tende a fugir-nos.
E entre a personagem principal e a autora?
Há de comum todo um imaginário de geração. Cresci nos anos 80, a ver séries de televisão inglesas (A Família Bellamy, Reviver o Passado em Brideshead, Amor em Clima Frio ou coisas bem mais cómicas como Fawlty Towers), a ouvir música anglo-americana (amplamente referida no livro), a ler livros de autores britânicos como as irmãs Brontë, Thomas Hardy ou Somerset Maugham. Era a janela possível para uma adolescência remediada, nos arredores de Lisboa, em plena época do governo Bloco Central.
Depois da Lisboa do Padre António Vieira, a Londres do romantismo inglês. História e ficção cruzam-se na sua escrita?
História, Jornalismo, Geografia, os filmes que vejo, as viagens que faço. De tudo isso se vai fazendo as histórias que escrevo.
Entrevista (que respeita o novo acordo ortográfico) publicada no JL 1052, de 26 de Janeiro de 2011.
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