Thursday, February 24, 2011

Diário das Correntes XXXXI

Pode a Literatura ser um campo de batalha? Parece que sim, a julgar pela 2.ª Mesa das Correntes, dedicada ao tema "Eu começo depois da escrita", que contou com a participação de Ignacio del Valle, João Paulo Cuenca, Júlio Conrado, Karla Suarez, Maria João Martins, Miguel Miranda e Carlos Vaz Marques, como moderador. De um lado, e com o privilégio de serem os primeiros a atacar, os escritores centraram as suas intervenções no seu trabalho. Aqui, o começo foi entendido como resultado de um jogo, de um embuste, de uma necessidade, de um simulacro. Karla Suarez contou, inclusivamente, como sonhou, em criança, ser actriz. No entanto, ficou angustiada com a ideia de todas as personagens terem o seu corpo e a sua voz. Pela escrita, os horizontes tornaram-se ilimitados. Assim, as personagens podiam viver em várias épocas, em vários mundos, com vários corpos, sem estarem presas às palavras do dramaturgo. Pela escrita, Karla Suarez ditaria as regras. No mesmo sentido, Miguel Miranda acrescentou: "A primeira escrita começa antes da escrita, é interior e intimista". E acrescentou: "Mas também começa depois da escrita porque não consigo suportar o silêncio ensurdecer que surge com o fim de cada livro".
O público, por seu turno, não se deixou ficar. Reagiu. E num contra-ataque recolocou a questão: Então e o leitor? Ah, pois é, exclamaram. É depois da escrita que o leitor começa e re-escreve qualquer história, através da leitura. Aberto o flanco, os ataques sucederam-se, levando João Paulo Cuenca a concluir: "Concordo plenamente. O leitor é um co-autor". E para rematar, disse: "Sou daqueles que defendem que o nome do leitor devia vir na capa".
As tréguas só chegaram quando o escritor moçambicano João Paulo Borges Coelho pediu a palavra. "Se calhar podemos resolver este conflito esquecendo os escritores e os leitores", brincou. "É melhor falarmos só dos livros".

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